Presidente pode receber título de cidadão honorário de vilarejo italiano onde nasceu seu bisavô. Mas políticos locais, religiosos e ativistas condenam honraria.
Por Octavio Neto
Fonte: G1.com
Em24/10/2021
A câmara de vereadores
de uma pequena cidade no norte da Itália deverá votar nesta
segunda-feira (25) uma proposta para conceder o título de cidadão honorário
ao presidente brasileiro, Jair Bolsonaro.
A homenagem, porém, gerou polêmica e declarações de indignação por parte de políticos locais, ativistas e até grupos religiosos, num momento em que o líder brasileiro é acusado de crimes contra a humanidade e outros delitos pela CPI da Pandemia no Senado.
A ideia de conceder o
título a Bolsonaro partiu de Alessandra Buoso, prefeita de Anguillara Veneta,
um pequeno município de apenas 4 mil habitantes localizado na região do Vêneto.
A cidade a 80 km de Veneza é terra natal de um bisavô do presidente.
Buoso defendeu que a
homenagem não tem motivação política. "Pensei nas pessoas do meu país que
migraram para o Brasil e construíram uma vida até chegar à Presidência, levando
o nome de Anguillara Veneta para o mundo", disse a prefeita em
entrevista à agência de notícias italiana Ansa na semana passada.
Questionada sobre os
crimes imputados a Bolsonaro pela CPI da Pandemia, a política italiana
justificou que não estava ciente das acusações. O relatório final da comissão
no Senado brasileiro foi apresentado na última quarta-feira, mesmo dia em que
Buoso assinou a proposta.
"Não posso entrar
na política brasileira. Infelizmente, o momento não foi favorável, até ontem
(quarta-feira) eu não sabia [das acusações]",
afirmou. A convocação para que a câmara de vereadores vote a proposta nesta segunda, contudo, segue mantida.
Reação da classe política local
A homenagem provocou
indignação em parte da classe política local. A parlamentar Vanessa Camani,
integrante da assembleia legislativa regional do Vêneto, lançou uma campanha
nas redes sociais contra o título de cidadão a Bolsonaro.
"Não à cidadania
a um racista, misógino e negacionista", afirma ela, que é membro da
direção nacional do Partido Democrático (PD), de centro-esquerda.
"Faz arrepiar a
proposta da prefeita de Anguillara Veneta de conferir a cidadania honorária a
Bolsonaro, conhecido pelos elogios à ditadura militar, pelo desprezo e ofensas
a mulheres e homossexuais, pelas ameaças de prisão aos adversários políticos,
ou pelas grotescas acusações contra ONGs pelos incêndios que devastaram a
Amazônia", escreveu a deputada no Facebook na semana passada.
Na postagem, Camani
também condena a "obscena gestão da emergência da Covid-19, que
colocou Bolsonaro entre os protagonistas do negacionismo mundial".
"Por favor nos explique, prefeita de Anguillara, por qual desses motivos
Bolsonaro merece ser cidadão honorário?", ironiza.
Em entrevista à
imprensa local, a parlamentar afirmou ainda que o líder brasileiro
"atrasou o início da campanha de vacinação por meses, promoveu tratamentos
sem eficácia comprovada, como a hidroxicloroquina, e mais de uma vez minimizou
o perigo do vírus, que tem causado estragos especialmente entre as populações
indígenas".
Neste domingo (24),
Camani publicou uma foto em que aparece ao lado de outros membros do Partido
Democrático nas ruas de Anguillara Veneta, onde estiveram, segundo ela, para
"reiterar nosso não à cidadania honorária a Bolsonaro".
O secretário regional
do Partido Democrático, Alessandro Bisato, também se pronunciou sobre a
proposta da prefeitura. "Tal como aquele soldado japonês na ilha do
Pacífico, sem saber do fim das hostilidades, a administração do município na
área de Pádua não entende o declínio do populismo", declarou o político,
citado pelo jornal "Il Fatto Quotidiano".
"Pior, pressiona
pelo reconhecimento público de um político alérgico à democracia e aos direitos
civis, um negacionista da Covid-19 e antivacina. Graças à política de
Bolsonaro, os brasileiros hoje estão mais pobres, menos seguros e nas garras da
Covid", concluiu.
Religiosos e ativistas também condenam
A homenagem à nomeação
também foi alvo de críticas de grupos religiosos e ativistas antibolsonaristas
na Itália. Em carta à prefeita de Anguillara Veneta, padres missionários
italianos baseados no Brasil se dizem "ofendidos, entristecidos e
desconcertados".
"Como cidadãos
italianos que trabalham no Brasil há anos a serviço do povo brasileiro e da
Igreja Católica brasileira (somos missionários, religiosos e 'Fidei
Donum'), nos sentimos
profundamente entristecidos e desconcertados. Nós nos perguntamos sobre quais
méritos? Como um homem que durante anos, e continuamente, desonra seu país pode
receber honra na Itália?", diz o texto.
"Jair Bolsonaro é
um presidente que está massacrando a vida do povo, especialmente dos mais
pobres; ele criou uma política anti-Covid (e ainda continua a fazê-lo) que
produziu milhares de mortes, promove a destruição e vende as terras da
Amazônia. Como pode um presidente que colabora com a destruição da Floresta
Amazônica receber honras em uma nação que luta pela preservação do
planeta?", continua a carta.
Os padres seguem
pedindo, então, que a cidade italiana não conceda o título. "Estamos
profundamente ofendidos e exigimos a revogação desta honra. Não a Bolsonaro e
sua política violenta e genocida!"
Nenhum comentário:
Postar um comentário